7 de julho de 2009

Sambando a dor de amar

"Amar como eu te amei ninguém jamais amará/Chorar tão pouco alguém chorou como eu chorei/Não sei, eu não sei/Por quanto tempo a dor irá perdurar no peito meu"

Quem nunca cantou esta musica com lágrimas nos olhos que atire a primeira pedra. Roberto Ribeiro leu a alma de cada cabrocha apaixonada, cada malandro que se deixou levar pela magia do amor e que em algum momento o perdeu para vida. E não existe melhor lugar para lavar a alma depois de um amor perdido que uma boa roda de samba.


Eu, com toda convicção, responderia a pergunta: "Por quanto tempo a dor irá perdurar?" com a resposta: por quanto tempo, nunca saberemos dizer, mas lembre-se que uma boa roda de samba ameniza a dor de um amor mal resolvido! Portanto, entregue-se a uma boa roda de samba. SE JOGUE na roda se necessário.


O coração apaixonado sonha demais, mas a realidade nos traz coisas nunca sonhadas. E ninguém melhor que o sambista para penetrar na alma de um apaixonado e trazê-lo de volta a esta realidade.


O sambista ao falar de amor usa palavras doces para bater forte, tão forte que uma única estrofe pode abalar os alicerces emocionais das poderosas mulheres do samba e até mesmo do malandro abusado. Nem os talaricos com toda sua malícia escapam do poder de um sambista. Palavra certa das horas incertas podem mudar nossas vidas.


Acredito que até hoje ninguém amou mais que Francisca Edwirges Neves Gonzaga - ou simplesmente Chiquinha Gonzaga: exemplo de Amor e dedicação, que em pleno século XIX abriu mão de tudo pelo amor!


Deixou os pais, o marido, os filhos; a religião; quebrou barreiras; lutou por aquilo que acreditava. Tudo isso em uma época em que a mulher era um ser inferiorizado e que devia respeito absoluto ao homem, fosse ele pai, marido ou sacerdote.


E tudo isso em nome do Amor! Queria ser feliz! Queria amar e ser amada! O mais incrível é que em meio a suas operetas populares, modinhas e choro ela abriu mão de seu grande amor, pai de sua filha, homem da noite, do mundo, malandro nato a quem se entregou deixando para traz sua família, marido, sociedade e reputação.


E fez isto por amor! Amor?


Ele não sabia que ao dar forças para ela e ao fazê-la abandonar tudo por ele e a incentivá-la a viver de sua música, nascia uma mulher revolucionária e forte e que não exitou em abandoná-lo em nome de sue verdadeiro amor: a música! o samba!


Acho que geneticamente nós mulheres sambistas temos o DNA de Chiquinha e a cada história de Amor, revivemos e reinventamos um pouco desse Amor vivido por ela.


Piramos, choramos, cantamos, bebemos, sambamos...


Quem depois de perder um amor não se entregou ao samba, tomou um porre, chorou?


Jurou odiá-lo para sempre. Jurou nunca mais amar ninguém. E ao som de um bom samba, amou novamente!


Muitas vezes, vamos à roda de samba para lavar a alma, jurando nunca mais amar e tendo toda a esperança que mais uma vez o samba irá nos resgatar e que as palavras do poeta serão uma oração em nossas vidas e libertando assim das algemas da solidão, levando essa dor de mim. Me perdoem o trocadilho, mas não tenho como falar do verdadeiro amor e das dores por ele provocadas sem parodiar nosso mestre Roberto Ribeiro.


Toda roda tem sua magia, seu encanto, mas algumas são marcadas por uma emoção especial. Quando todos aqueles solteiros e solitários teriam motivos para estarem tristes ou entregues à solidão, eles estavam ali radiantes, felizes, unidos pela força do samba. As pessoas estavam iluminadas: uma aura de alegria estava no ar! O amor de Chiquinha estava ali...


Toda tristeza é levada ao primeiro acorde do cavaco e o único nó na garganta que temos é ao ouvir a emoção do sambista ao interpretar “Tendência” de Ivone Lara. Independente de estado civil, de estar acompanhadas ou não, o samba nos une e ali encontramos pessoas apaixonadas. Amando sim, amando o samba: um amor maior que cura todas as feridas.


Voltando mais uma vez à música de nosso mestre maior: “Enfim eu cheguei a conclusão/Que não se deve entregar o coração/A quem não sabe o preço de um grande amor/E desconhece o sabor de uma dor de amar”. E ninguém melhor que as sambistas e os malandros para saberem exatamente o que é a dor de amar!


Elas amando, eles se fazendo amar - não que os malandros não amem, mas seus parâmetros e sua entrega são outros. Ambos buscando pela felicidade nos encontros e desencontros que nem os orixás poderiam explicar, mas que os sambistas sabem transformar em poesia - poesias musicadas que ao serem interpretadas trazem toda emoção do poeta aos olhos de quem as ouve; poesias que provam que quando o amor é muito grande ele transborda pelos olhos de quem ama.


Dor que todos dizemos nunca mais querer passar, mas que não sabemos viver sem; dor inspiradora; dor que move o coração; dor que nos dá coragem para continuar mesmo dizendo que vamos desistir de tudo; dor da alma que só o sambista sabe decifrar.


A roda de samba é o melhor lugar para se amar, para se recuperar de um amor perdido, para refletir sobre um amor complicado, para conhecer um novo amor, para chorar as dores do amor, para ser feliz!


Amando, sendo amado, cantando e, acima de tudo, celebrando a vida e toda alegria que só a roda de samba pode proporcionar.


Salve Chiqunha Gonzaga que nos ensinou o que é o Amor e que nos ensina ao passar dos séculos que amar vale sim a pena e que a entrega é fundamental, mas que o sofrimento é opcional, afinal amamos de forma plena, nos entregamos totalmente, sustentamos enquanto podemos e quando não agüentamos e perdemos... sambamos!